Anunciado como novo papa em uma votação tida como surpreendente, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio é investigado dentro de seu país pela colaboração com a ditadura.
Nos dois processos mais famosos, responde pela ajuda que teria dado ao sequestro e à tortura de dois jesuítas e à apropriação de bebês, prática comum do último regime militar (1976-83).
Em 2010, juízes do Tribunal Oral Federal número 5 foram até a sede do arcebispado de Buenos Aires tomar o depoimento do cardeal, acusado de trabalhar pelo sequestro e pela tortura de dois jesuítas em 1976. Naquele momento, Bergoglio comandava a Companhia de Jesus em San Miguel, e uma série de testemunhos o conectam ao crime.
Em 2010, o médico Lorenzo Riquelme, então com 58 anos, declarou que o grupo que o sequestrou e torturou saiu da sede da Companhia de Jesus. Militante da Juventude Peronista e do movimento cristão, Riquelme deu a declaração com base no que foi dito a sua mulher, também raptada. Ela trabalhava no Observatório de Física Cósmica de San Miguel, que passou de um reduto peronista a um lugar de atuação de homens infiltrados da Marinha e sob controle de Bergoglio.
Mom Debussy, um jesuíta que tinha a confiança de Bergoglio, afirmou que algumas vezes o cardeal lhe contou sobre os projetos de Massera, sempre demonstrando simpatia pelo regime, e que pretendia vender à Marinha o Observatório de Física. Debussy disse ainda que os trabalhadores do Observatório eram demitidos pelo religioso depois de voltar das sessões de tortura.
Outro documento oficial, datado de 1976, narra o que o líder religioso defendeu a comandantes militares. Advogou esclarecer a posição da Igreja Católica, de suporte ao regime, afirmando que “de nenhuma maneira pretendemos formular uma posição de crítica ao governo”, dado que um fracasso “levaria, com muita probabilidade, ao marxismo”.
No mesmo ano, a Justiça francesa determinou que o Judiciário argentino tomasse o depoimento de Bergoglio pela suspeita de participação no desaparecimento de um padre francês que morou na Companhia de Jesus. O testemunho de uma monja em 1984 já indicava a relação do então chefe da congregação com o sequestro que resultou nas mortes de Gabriel Longueville e do sacerdote Carlos de Dios Murias.